Normalmente fincamos nossos olhos no futuro, mas nesta manhã antes de levantar me lembrei dos acontecimentos passados. Fecho os olhos para que a sensação de estar lá seja mais forte.
Levanto-me cedo e saio correndo para não perder a hora, quero dar uma passadinha no hospital antes de começar o batente. Ao chegar, conversamos sobre a chegada de nosso primeiro filho, das dificuldades da vida, o menino, as mazelas da vida, o menino, o hospital, o menino, a chegada, o menino.
Saio, e ao sair fico com a sensação de querer ficar, participar mais. Mas o dia a dia me chama, nos chama, eu, você, a todos. O dia segue seu correr, e nele me fixo para que a ansiedade não me consuma. Vou para a faculdade, hoje tenho prova. Ao sair da prova dou uma ligadinha para o hospital, a enfermeira me atende, e pelo tom de minha voz, sou facilmente identificado como; um futuro papai de primeira viajem, ela logo se simpatiza com minha natural inexperiência, e tasca: “É hoje, não deve demorar mais que 2 horas, se você não demorar a chegar, deixo ver a criança”.
Desembestado saio a procurar, e me meto no primeiro táxi que vejo, explico a situação. O moço veste seu quepe de aviador, olha para um lado, olha para o outro, para ter a certeza que não havia ninguém vendo, alçamos vôo. Lá de cima vejo tudo pequeno, parecem pequenas formigas. Chegamos ao hospital, como se não houvesse trânsito, faróis, nem distância a nos separar.
Ao chegar a enfermeira; “já está para começar, escreve um bilhete ai!”. A caneta, o papel, o pensar, não sei como começar, queria lá estar, o nervosismo, quase não consigo escrever, parece que levei duas eternidades para mandar o tal bilhete, mas lá se foi ele. Começo uma briga com o relógio, eu olho e ele tic, olho para o corredor ele tac, tic tac, olho em volta e ninguém, e ele tic tac, segundos, minutos, tic tac, tic tac e tic tac.
A tal enfermeira; “ele nasceu, parabéns é um belo menino vai ficar na luz, quer vê-lo?”. Ora que pergunta, se quero vê-lo, ninguém vem e lhe pergunta; se você quer respirar, se você quer enxergar, ou coisa parecida. Sou levando a uma sala, que dá numa sala, onde visto uma indumentária que me faria passar por um desses doutores que salvam vidas. Quando entro, parece que não existe mais nada, nada vejo, nada ouço, naquele momento, existe apenas aquele pequeno grande menino, que abre sua pequena boca e parece querer soltar todo o ar que existe no mundo, chora copiosamente, assustado embaixo daquela luz a fustigá-lo, chego perto, e o pego, pego como quem pega uma preciosidade, com o cuidado daqueles que nunca tiveram uma joia de raro valor nas mãos, o seguro, quando começo a falar, ao som de minha voz, o choro se dissipa, ele abre seus pequenos olhos, para de chorar e se compenetra no som de minha voz, começamos um dialogo monologo, e falamos sobre a vida, sobre nossa vida, sobre sua vida, e assim falamos por minutos, por horas, os dias passam, nossa conversa parece não ter fim.
Em um dado momento fecho os olhos, escuto o som do despertador e sou arremessado de volta ao presente. Olho para o relógio e me levanto correndo para não perder a hora.